O assassinato dos irmãos Gabrielle Souza Mota, de 25 anos, e Andrey Pereira Mota, de 31 anos, já completou um ano e quatro meses sem que o inquérito policial tenha sido concluído. O crime ocorrido na madrugada de 28 de outubro de 2023, no estacionamento da Feira Agropecuária de Canaã dos Carajás – ExpoCanaã, chocou a cidade paraense de 77 mil habitantes.
O portal Correio de Carajás teve acesso com exclusividade ao processo do caso, composto por 163 páginas, que contém detalhes da investigação, mas ainda é incapaz de responder quem matou Gabrielle e Andrey, questionamento que se faz diariamente Celma Mota, mãe de Gabrielle e madrasta de Andrey.
Treze dias antes do duplo assassinato, um fato importante aconteceu. Celma recebeu uma mensagem por WhatsApp, no dia 15 de outubro de 2023, afirmando o seguinte: “Da ums concelhos para sua filha, parar de se envolver com homem casado, esse p***. Porquê se ela continuar nessa situação ela vai acha o que ela não quer! O recado está dado (sic)”.
O ocorrido consta no processo e foi confirmado pela mãe da vítima ao Correio de Carajás. Celma afirmou desconhecer o número de onde partiu a ameaça e contou que tentou diversas vezes ligar para descobrir a identidade do autor, mas sem sucesso.
Celma relembra ter questionado a filha, na época, sobre o teor da mensagem. A filha afirmou não manter nenhum relacionamento amoroso, muito menos com alguém casado, uma vez que ela havia se separado sessenta dias antes.
No decorrer das investigações, a Polícia Civil de Canaã dos Carajás localizou o dono do aparelho de onde partiu a mensagem para Celma Mota ameaçando Gabrielle. O aparelho em questão é usado de forma comercial em uma loja de assistência técnica de celulares, mas nele foram usados diferentes chips. Além disso, várias pessoas tinham acesso ao telefone. Ao todo, seis foram intimadas e compareceram na Delegacia de Polícia Civil para depor na condição de testemunhas. Apesar das oitivas, não consta no processo que a PC tenha identificado o responsável pela ameaça.
MADRUGADA DO CRIME
Uma amiga de Gabrielle, que estava no banco traseiro do veículo durante o crime, detalhou na época que, por volta das 4 horas, quando um show da ExpoCanaã acabou, ela, Gabrielle e Andrey foram para o estacionamento.
Gabrielle entrou no veículo, um Polo de cor branca, enquanto o irmão sentou no banco do passageiro. A amiga ficou no banco de trás.
Gabrielle ligou o carro e abaixou os vidros para dar ré. Nesse momento, o assassino anunciou um assalto e exigiu a chave do carro, que foi imediatamente entregue. Em seguida, o criminoso também ordenou que eles entregassem os aparelhos celulares.
Andrey foi o primeiro a entregar. Nervosa, Gabrielle deixou cair o aparelho dela entre os bancos do motorista e passageiro. Ela então ligou a luz do carro para procurar o celular. Nesse momento, o criminoso brigou com ela e disse: “desliga a p*** da luz, tá pensando que essa arma é de brincadeira?”.
A vítima obedeceu à ordem do criminoso e quando encontrou o celular o entregou. Conforme a testemunha, o assassino então “encostou o cano da arma na cabeça de Gabrielle e empurrou, afastou a arma e efetuou um disparo”, em seguida, o criminoso atirou distante a cinquenta centímetros contra Andrey, atingindo a cabeça dele.
Depois de balear os irmãos, o assassino pareceu se assustar com alguma coisa e fugiu, levando os celulares e a chave do carro. A testemunha relata que ele “foi por trás do carro e subiu na garupa de uma motocicleta alta”. O veículo tinha cor escura, conforme informações que constam nos autos.
A testemunha viu o rosto do assassino responsável por efetuar os disparos, o descrevendo como um homem de cor parda, rosto redondo, que usava óculos de grau e com uma camisa de cor escura. O exame de balística indicou que a arma de onde partiram os disparos é um revólver calibre 38.
As investigações policiais confirmaram, também por meio de perícia, que “os criminosos esvaziaram os dois pneus do lado do motorista, demonstrando premeditação” do crime.
Celma Mota não acredita que as mortes da filha e do enteado tenham sido um latrocínio (roubo seguido de morte). Além dos pneus murchos e da mensagem contendo uma ameaça, ela afirma que a bolsa da filha com todos os pertences não foi levada, tampouco exigida pelos criminosos. Andrey, por sua vez, estava com relógio e dinheiro quando foi assassinado.
Nos autos, é dito que o local do duplo assassinato não tinha câmeras, entretanto, a Polícia Civil solicitou à Secretaria Municipal de Segurança Pública Viária (SEMSPUV) imagens do sistema de monitoramento que pudessem conter imagens dos suspeitos. Foi possível observar que três motocicletas com características semelhantes transitaram pelas ruas próximas entre 4h25 e 5h31.
Uma busca pelos dados cadastrais dos veículos foi realizada, ainda assim, não consta no processo que os donos dos veículos tenham sido ouvidos no inquérito policial.
DOIS DELEGADOS
O atual responsável pelo inquérito policial é o delegado Luca França da Costa Soares. Ele assumiu o caso em abril de 2024, após a primeira delegada, Isabella de Luca Martines, ser transferida para a cidade de Parauapebas.
Assim que assumiu o caso, o delegado Luca solicitou ao juiz da Vara Criminal da Comarca de Canaã dos Carajás a prorrogação do prazo para concluir as investigações. No documento enviado ao magistrado, a autoridade policial justificou o pedido alegando ter sido transferido para a delegacia recentemente.
Outros pedidos de prorrogação para a conclusão do inquérito foram solicitados pelo delegado. Assim, o processo ainda não foi concluído e está parado.
O Correio de Carajás entrou em contato com a Polícia Civil por meio da assessoria de comunicação no dia 28 de fevereiro deste ano, quando o caso completou um ano e quatro meses, mas não recebeu resposta.
Nesta sexta-feira (7), foi novamente solicitada uma nota de esclarecimento questionando se há prazo para conclusão do inquérito policial e o motivo de a investigação ainda não ter sido concluída. Até essa publicação não houve retorno.
A reportagem também procurou o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), por meio da assessoria de comunicação. Em nota, o órgão respondeu que a Promotoria de Justiça de Canaã dos Carajás tem ciência dos fatos ocorridos e aguarda o fim do inquérito policial para se manifestar sobre o caso apenas após análise dos autos, “a fim de verificar se serão necessárias novas diligências ou não.”
ANIVERSÁRIO
Andrey morava na cidade de Xinguara, onde trabalhava como entregador. Por ser aniversário do pai, Antônio Rodrigues Mota, no dia 27 de outubro viajou para Canaã com a intenção de comemorar junto à família. Como o genitor iria trabalhar no dia seguinte pela manhã, decidiu-se adiar a confraternização para o sábado, dia 28.
Os irmãos, então, foram para um show na ExpoCanaã. Por volta das 3 horas da madrugada, Celma ligou para a filha pedindo para irem embora. “Naquela noite eu não dormi, fiquei esperando por ela”. Gabrielle disse à mãe que se precisasse falar com ela novamente que ligasse para o irmão, pois a bateria do telefone dela estava descarregando.
Às 4 horas ambos já não atendiam mais os celulares. “Quando percebi, um amigo da minha filha estava no portão de casa. Na hora pensei que ela tivesse batido o carro, se acidentado”. As notícias, contudo, eram piores.
A mãe relembra que Gabrielle ainda chegou a ser encaminhada para o hospital. “O meu marido perguntou para o amigo da Gabrielle ‘cadê o meu filho?’ e ele disse ‘eu sinto muito, mas o Andrey morreu na hora’. O Antonio ficou desesperado. Eu perdi a minha única filha e ele perdeu os dois únicos filhos dele de uma só vez”, emociona-se a mulher. Os irmãos foram enterrados juntos na cidade de Xinguara.
MOTIVAÇÃO
Celma afirma que Gabrielle era uma pessoa de muitos amigos e querida por todos, por isso, não entende quais as motivações para que cometessem o crime. Andrey também não tinha inimizades e raramente ia a Canaã dos Carajás.
Gabrielle era mãe de dois meninos, um recém-nascido à época do crimeo e outro de 5 anos. O mais velho vive Celma, enquanto o mais novo, que tem apenas um ano e quatro meses, mora com o pai, último relacionamento amoroso de Gabrille.
DENÚNCIA
Quem tiver informações que possam levar aos autores do crime basta ligar para o Disque-Denúncia 181. As informações podem ser repassadas anonimamente.
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